Editorial

EDITORIAL


Tecnologia Assistiva – Podcast do Artigo
Locução – Lunna Mara

Caro leitor,

A experiência atual com as aulas remotas é única. Os professores enfrentaram também suas dificuldades no acesso às aulas e precisaram reinventar seu próprio jeito de lecionar. Muitos cursos a distância ofertaram aos discentes novos conhecimentos, principalmente na área da educação mediada por tecnologia. Para os estudantes, o desafio foi a presença de uma nova escola e uma nova forma de ensinar e aprender.  Pensando, especificamente, no estudante com deficiência — compreende-se aquele com deficiência intelectual, transtornos do espectro autista, altas habilidades e superdotação, mental e sensorial— outros fatores tornaram esse momento mais desafiador, pois, além dessas variantes, o déficit cognitivo de alguns e outras particularidades advindas desse grupo promoveu na escola um fazer pedagógico diferente, pensando na inclusão de todos. Foi um período de muitas incertezas e as instituições de ensino se mobilizaram  para não deixar ninguém fora da “nova escola”.

O ano de 2020 ficou marcado por tragédias, no enfrentamento da pandemia do novo coronavírus (Covid-19), ceifando vidas, excluindo vários estudantes da escola. Ficamos imersos num caos educacional sem saber que direção tomar, visto que as perspectivas não eram satisfatórias quanto ao atendimento da comunidade escolar. A rotina das escolas públicas no Distrito Federal foi alterada de forma abrupta e sem muito tempo para planejar novas estratégias que substituíssem as quais  já estavam prontas, porque o ano letivo  havia começado presencialmente. No campo do atendimento educacional especializado, as salas de recursos generalistas e de altas habilidades e superdotação experimentaram, além das dificuldades apontadas, os obstáculos advindos desse momento para  garantir a mesma qualidade do atendimento presencial. Quase um novo começo, pois, conhecer bem o estudante, criar um vínculo afetivo — fundamental nesse atendimento — promover interações importantes para seu desenvolvimento, são imprescindíveis para seu avanço na escola, que, muitas vezes, vai além do currículo. Esse tempo ficou com uma lacuna, tendo em vista que as escolas estavam ainda organizando o trabalho pedagógico e muitos estudantes ainda não eram bem conhecidos (novos na escola, por ser início do ano letivo). Nesse contexto, não há dúvidas de que o trabalho executado pelas salas de recursos generalistas e de altas habilidades e superdotação também precisaram inovar para não deixar ninguém de fora, o que, a princípio, parecia uma utopia.

A educação inclusiva, na perspectiva da educação para todos, permeia todos os espaços escolares, com o objetivo de garantir as aprendizagens e disponibilizar a esse estudante condições sociais, físicas, emocionais dentro e fora da escola. Essas condições são possíveis, porém, em tempo de aula remota, torna-se um fator desfavorável já que a socialização no ambiente virtual é diferente. 

Ainda que as condições não sejam favoráveis, pensar em inclusão é remeter a tudo que foi construído ao longo da história da educação, na esfera da educação especial. Temos uma vasta legislação que trata do direito à educação inclusiva, tais como a Constituição, a Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência da ONU, a Lei Brasileira de Inclusão nº 13.145/2015. E agora, surge, em virtude das aulas remotas, o Parecer nº 11/2020 de 7 de julho, que trata de Orientações Educacionais para a Realização das Aulas e Atividades Pedagógicas Presenciais e Não Presenciais no contexto da pandemia (p. 25 e 26). São orientações importantes.

 Além disso, o estudante da educação especial dispõe de um currículo adaptado às suas condições, facilitando a organização pedagógica para garantir sua aprendizagem dentro do que ele é capaz de realizar, considerando sempre suas particularidades. Esse movimento leva novamente o professor de sala regular e do atendimento educacional especializado (sala de recursos generalista e AH/SD) a trabalharem juntos, ampliando as possibilidades do atendimento, mesmo de forma remota. Em consonância, temos o envolvimento das famílias e, também, ações que atendam as condições afetivo-emocionais desse estudante.

A avaliação é outro momento comum da rotina escolar e, também, movimenta professores do atendimento educacional especializado a pensar novas estratégias para verificar o desempenho desse estudante. Novamente, não se pode pensar em trabalho isolado. É uma premissa a interlocução constante com os demais membros da escola (coordenação, professores da aula regular, gestor…). Este permeia o trabalho da educação especial em todas as instâncias.         

Pensemos, agora, nas tecnologias e no acesso desses estudantes às ferramentas disponibilizadas no ensino remoto. O Google Classroom foi a tecnologia adotada oficialmente no Distrito Federal para as aulas a distância. Todavia, o acesso à aula foi dificultado pela falta de internet em muitos lares. Atento a isso, o professor usou de outras possibilidades como WhatsApp, vídeoaulas, atividades com vídeo, atividades impressas, tentando garantir a presença de todos. O uso desses recursos também precisou ser adaptado para atender a realidade de cada estudante. E, em se tratando do estudante com  Deficiência, é necessário pensar não só no acesso à rede, mas, também ao conteúdo. Isso exige um acompanhamento maior por parte dos professores das salas de recursos e uma articulação conjunta no planejamento pedagógico da escola. Não pode ser uma ação apenas do atendimento educacional especializado.

Tendo em vista o exposto, é fácil compreender que a experiência foi única e que se estende até agora, em 2021. A mobilização dos professores para se apoderar das ferramentas tecnológicas que promova acesso ao currículo a todos, sem distinção não terminou. Convém ressaltar que mesmo em condições tecnológicas favoráveis temos ainda o distanciamento provocado pela pandemia. Isso retirou uma parte importante desse trabalho, pois a escola é um espaço de vida e aconchego que proporciona o desenvolvimento das relações interpessoais. Muito mais que um prédio, é movimento de vidas. Por mais que sejam criadas alternativas para esses encontros virtualmente, não há como substituir a presença física que transcende as paredes da escola quando ela está em movimento. Isso também é um fazer pedagógico. Corrigir tarefas, adaptar o currículo, implementar avaliações diferenciadas não são as únicas demandas. É preciso, neste momento, estarmos imbuídos de sentimentos e fazer reflexões diárias, com um diálogo aberto e franco, na direção que toda escola deve estar e, independente das condições, deve-se estar sempre a favor das aprendizagens. Não se pode promover a aprendizagem, nessa situação, no campo individual. Mais do que nunca é necessário que a escola interaja e promova debates, onde as famílias precisam ser ouvidas. Presenciamos o desabrochar de ideias inovadoras que marcaram positivamente um momento tão difícil no Brasil e no mundo. A escola, sem dúvida, foi assertiva e resiliente, porém, precisamos reconhecer que ficaram muitas lacunas. Muitos estudantes se perderam no caminho, mesmo com todos os esforços pedagógicos para que a célebre frase “nenhum a menos” se concretizasse.

Por fim, o que temos para 2021? Nasce um novo ano e, claro, as esperanças se renovam com a possibilidade de vacinação em toda a população. Mas isso não acontecerá da noite para o dia e a escola precisa, novamente, reinventar-se pedagogicamente e dessa vez com a bagagem cheia de grandes experiências, erros e acertos. Trata-se, nesse momento, de ressaltar os aspectos positivos que permearam essa experiência rica de aprendizagem, tanto para o professor, quanto para o estudante. E tudo isso para chegar a um ambiente mais desafiador ainda na escola que é o atendimento educacional especializado e as ações de quem trabalha com estudante com deficiência. Muito temos que aprender e fazer, mas tudo funciona melhor quando a orquestra dessa linda sinfonia toca harmonicamente sob a direção de um grande maestro. Para a educação inclusiva é imprescindível o trabalho coletivo. Sua organização pedagógica parte também do planejamento da escola. Nunca foi tão importante as trocas de experiências. A Sala de Recursos Revista, também, tem como premissa a construção coletiva e sempre na perspetiva da inclusão. Boa leitura.

         

         

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